O que é o virtual? Pierre Lévy - Resenha

Pierre Lévy, filósofo da informação, que estuda as interações entre a sociedade e os sistemas virtuais de comunicação, em seu livro O que é o virtual?, busca uma definição para virtualidade, esclarecendo conceitos, analisando e ilustrando um processo de transformação social que afeta a comunicação, os corpos, as técnicas e a inteligência. Entender este processo torna-se necessário para manter a estabilidade, segundo o autor, “antes de temê-la ou negá-la é preciso compreendê-la.”

Lévy inicia, situando o leitor quanto a conceitos importantes para a compreensão do que vem a ser virtualidade: O atual, o virtual, o possível e o real. Ao contrário do que podemos imaginar, o virtual não se opõe ao real, mas ao atual. O virtual atualiza-se, transforma-se a a partir de interações. O possível realiza-se, sem mudar sua natureza, é algo pré-definido. O virtual é um conjunto de “nós” que espera uma atualização, uma resolução dinâmica e que por sua vez o realimenta, o virtual e atual são dialéticos. A virtualização fluidifica, desterritorializa, não é necessário estar presente. As interações virtuais reorganizam o conceito espaço-tempo, que passam a ser plurais.

Essa pluralidade nos a força a heterogeneidade, não existe uma extensão determinada, saltamos de uma rede a outra e os espaços se modificam de acordo com a interação estabelecida. O corpo sai de si mesmo, adquire novas velocidades, se multiplica. Um só corpo participando das redes integrando um hipercorpo globalizado. O esforço de ultrapassar limites e de tornar sensações mais intensas são reações a virtualização, a tentativa de marcar a presença física e re-encontrar a pessoa em seu ponto vital, atualizando. A virtualização é uma reinvenção do humano.

O texto já é objeto virtual, uma vez que possibilita atualizações à medida que o lemos, o relacionamos e damos sentido a ele dentro de um contexto que é muito particular, como afirma Lévy, “Ele nos terá servido de interface com nós próprios.” Sendo assim, esta entidade virtual nos permite reorganizar nossos modelos de mundo, reatualizando e ressignificando o que somos. Um filme, por exemplo pode ter várias leituras de acordo com o repertório cultural de quem o assiste, são atualizações que fazemos de um objeto virtualizado.
Segundo o autor, a escrita é a virtualização do pensamento, não é somente a representação da fala, com ela surge uma comunicação que separa a mensagem da fonte de emissão, estando a serviço do leitor e assim permitindo atualizações de acordo com particularidades deste leitor.

O virtual só nasce com a subjetividade humana, o texto é a potencialização da informação, o computador, as redes, nos permitem interagir com essa informação nos levando a novas leituras, ressignificando pensamentos, favorecendo ligações hipertextuais, virtualizando os processos de leitura, e sendo Lévy, “ a partir do hipertexto, toda leitura tornou-se um ato de escrita.”

A desterritorialização do texto não distingue original da cópia, o ciberespaço mistura unidade, identidade e localização. Não existe um texto, não há fronteiras. Agora ele é acessível em todo e qualquer lugar e todos podem modificá-lo. A interpretação está longe das intenções do autor, pertence a quem se apropria e lhe atribui sentido aqui e agora.
Surge uma nova forma de se relacionar com o texto, com a leitura, uma relação mais dinâmica e que exige mais deste novo leitor.

A virtualização nos faz viver a passagem de uma economia das substâncias a uma economia dos acontecimentos. Para aumentar a eficácia, é preciso valorizar a virtualização das competências, aumentando a inteligência coletiva. A virtualização do mercado muda completamente o papel de produtores, consumidores e intermediários. Não existem mais as distâncias geográficas, estamos num mercado mais transparente, diferenciado e personalizado. Não há espaço para intermediários, daí surge uma nova relação:mais interativa e direta que mistura produtores e consumidores, muitas vezes com alternância de papeis.

O autor apresenta as três virtualizações que, segundo ele, constituem o humano: em primeiro plano a linguagem com a possibilidade de re-elaborar e reinventar, abrindo novos espaços e novas velocidades transformando as relações de aprendizagem. Quanto mais ricas as linguagens, maiores as possibilidades. Linguagem aqui, entende-se como mais que apenas a palavra, a fala. As linguagens virtualizam o tempo, as coisas, os acontecimentos e as situações.
Em segundo plano, a virtualização da ação, apresentando uma recomposição do corpo e do ambiente físico, tendo a ferramenta como operacionalizadora.
A terceira enfoca as relações sociais em sua cultura e complexidade. A arte aparece em confluência com estas correntes de virtualização.
Surge um sujeito fruto de uma virtualização que amplia suas possibilidades de interação com o mundo e que se integra com um coletivo pensante, que pode ser explicado com as palavras do autor, quando afirma que “é impossível exercermos nossa inteligência independentemente das línguas, linguagens e sistemas de signos que herdamos através da cultura e que milhares ou milhões de outras pessoas utilizam conosco”, conclui Lévy. Cada zona deste hipercórtex contém um psiquismo, afinal a vida social é cheia de afetos e conflitos. Esta inteligência coletiva valoriza a diversidade de competências e recursos.

O ciberespaço instiga inteligência coletiva que se vê seduzida por um objeto dinâmico, desterritorializado que produz vínculos e conhecimento, que acelera objetos, impulsionando as relações de predação e apropriação, um “virtualização de virtuais”.
A virtualização não é fenômeno recente, vivemos este processo há muito, segundo Levy, o possível, o real, o atual e o virtual se relacionam e se complementam.

E para concluir, destaco um trecho do epílogo: “Creio que o sofrimento de submeter-se à virtualização sem compreendê-la é uma das principais causas da loucura e da violência do nosso tempo”, na verdade me convida a uma releitura com outro olhar, com menos ansiedade em desvendar esta tal virtualidade” tão assustadora e desumana que acreditava tão distante de mim.
Percebo que é justamente o contrário, estou sim, vivendo esta virtualização e tentando acompanhá-la, ressignificando para não me sentir arrastada por este turbilhão.


Resenha elaborada por Luzia Lima, aluna do curso de pós-graduação Educação e Novas Tecnologias Módulo I
Agosto de 2010